sexta-feira, 7 de outubro de 2011

... Deixemos somente...


Deixemos num sopro o imenso turbilhão da existência de ser…
Deixemos num sorriso a mágoa da melancolia…
Deixemos num beijo o agreste de toda a raiva…
Deixemos num abraço a frieza da insensibilidade…

Deixemos um tudo de nada,
Deixemos a vida… Deixemos somente…

O tempo passa e nada resiste…

quarta-feira, 5 de outubro de 2011

Desconcerto


Tem dias em que sou desconcerto. Peças soltas e quebradas de um eu que, em alguns dias, é completo.
Uma falta de sentidos e de conexões. Como se meus neurônios ficassem atordoados pelos choques sinápticos e se perdessem em minhas entranhas.
Idéias loucas e bagunçadas. Desconexão!
É quando paro e penso, ou tento pensar, em tudo que sinto, faço, quero. Alguns dias da semana são propícios a isso. Como aquela manhã em que você acorda atrasada e esquece onde colocou as chaves do carro. Ou quando você resolve sair para almoçar e descobre um erro em uma parte importante de seu trabalho que precisa ser reparado na hora.
Aí, você respira fundo, enche os pulmões de ar e faz os neurônios ‘sinapsiarem’ [acho que inventei uma palavra] mais rápido, pra ver se acelera o trabalho e ainda consegue chegar ao restaurante antes dele fechar e você ter de contentar-se com um pastel da padaria.
Tem dias em que sou desconcerto. Como nos dias em que sinto falta de algo que ainda nem vivi, ou de pessoas que nunca encontrei. De lugares que nunca conheci e vozes que nunca ouvi.
Ou aqueles dias em que se sente uma falta absurda do colo do pai. Do abraço apertado da mãe e do sorriso bobo do bobo do irmão que você ama mais que a você mesma.
Dias em que o Sol parece que te ‘olha’ torto e quer te dizer pra você passar mais protetor, ou, quem sabe, levar o guarda chuva pra rua porque ele vai se esconder em meio às nuvens carregadas mais tarde e você pode se molhar. E você não dá ouvidos e fica nervosa quando a chuva cai e molha sua roupa e seu sapato, aqueles escolhidos à dedo para passar o dia no trabalho e ir direto para um jantar importante depois do expediente.
Tem dias em que os dias parecem noites sem fim. Noites escuras, sem estrelas... E você acende a luz na tentativa de iluminar um pouco a escuridão que teima em se instalar em sua alma. As horas passam lentas, os momentos ruins parecem infinitos. Uma dorzinha chata teima em se instalar no estômago, ou na cabeça, ou no estômago e na cabeça. E até o barulhinho do hamster correndo na gaiola parece que te incomoda, mesmo quando você sabe, dentro de você, que adora aquele som que te encanta o dia ‘todos os dias’.
Mas tem dias em que sou desconcerto. E tento, infinita e incansavelmente, um conserto que sei impossível. Tento encaixar peças, procurar pedaços faltantes de uma ‘mim mesma’ que não sei onde deixei. Mas sei que existe e que pede socorro. Que pode ser completa como em alguns dias quando o Sol brilha sem nuvens e as horas seguem seu curso normal, como águas calmas em rio tranquilo.
Tem dias em que sou desconcerto. E, nesses dias, percebo que não sou só eu, mas, todo o infinito de meu mundo... Que perde peças, cores, nuances... Inexplicavelmente, sem deixar vestígios.
E, de verdade, algumas vezes, nesses dias em que sou desconcerto, é quando me sinto mais certa, mais ‘encaixada’ nessa bola que chamamos mundo e nesse espaço de tempo que chamamos vida.
Os dias em que sou desconcerto me consertam para os dias em que sou completa. 


segunda-feira, 3 de outubro de 2011

Em cartaz: A Vida Real... A Minha Vida!

Abrem-se as cortinas do palco da vida e nós entramos. Como atores em um teatro. Encenando e tentando transformar em realidade os sonhos e vontades escritos pela nossa alma.
Engraçado como, em muitas vezes, não conseguimos nada mais que desastres. Somos sempre vencidos pela força do palco da vida. Não importam quais sejam nossas vontades, nossos sonhos. Parece que a peça a ser encenada segue um rumo tão meticulosamente projetado pelo autor, que não importa que sacrifícios sejam feitos, que artifícios usemos, não conseguimos mudar o final.
Tudo que conseguimos é nos frustrar diante das decepções. Choramos, gritamos, esperneamos, batemos a cabeça contra a parede e, erguemo-nos enxugando as lágrimas e ajeitando os cabelos bagunçados para dar sequência ao espetáculo e encenar o próximo ato já previamente escrito e sobre o qual raramente podemos opinar.
Às vezes, muitas vezes, me sinto como uma marionete nesse tal palco. Quase posso sentir o ‘autor’ de minha história puxando as cordinhas de meu corpo e me dizendo o que devo fazer, que parte do corpo mexer em determinado momento, para onde caminhar, quando parar.
É certo que desobedeço em diversas ocasiões, forço as cordas do destino a caminharem para o lado contrário, determino minhas vontades, amadureço ideias, complico a vida do roteirista de minha vida... Mas, no final das contas, nada sai exatamente do jeito que eu queria. Parece que o fim da história já está escrito antes mesmo dela começar... E, por mais que eu me esforce... Por mais que eu force e reforce minhas necessidades, não consigo mudar. O máximo que consigo é atrasar ou adiantar um fatídico final que nunca é o planejado.
Em diversas ocasiões, quando me frustro com o rumo tomado por minha vida nessa trama imensa, me pego pensando em como seria se eu realmente tivesse poder sobre meu destino, sobre minhas decisões. Se, quando eu tomasse esta ou aquela decisão, imaginando a cena lá na frente, o final fosse do jeito que houvesse imaginado. Seria bom poder ser diretora, autora, roteirista de minha própria vida. Seria bom contracenar com os atores escolhidos e desenhar as nuances e os finais da forma que nos completasse mais. Esperar os aplausos pelo belo espetáculo encenado. Colher os louros. Saborear o sabor do espetáculo grandioso da vida. A vida, essa novela que segue capítulos diários e que não tem data marcada para chegar ao final.
Em outras ocasiões fico pensando... Se a vida segue os rumos do autor, esse bem que poderia ser um Manoel Carlos e eu uma de suas ‘Helenas’... Porque se assim fosse, eu seria a heroína e, depois de muito sofrimento e choro, ele me daria um final grandioso, com muita pompa, circunstância e felicidade. Assim eu nem ligaria por ser uma ‘marionete’ e deixá-lo puxar minhas cordinhas para me dar a direção a seguir durante a trama.

Estupidez é não viver...


Desgasto o gosto da vida nas incansáveis tentativas de construir-me...
Alivio as perdas nos ganhos, mas sempre me sobram dividendos... Nunca lucros.
É uma via de mão única essa coisa de sentimentos. Raramente conseguimos pegar via de duplo sentido, ou, pelo menos uma pista alternativa onde possamos escoar nossas frustrações em caso de perda de freios...
Vivemos a ausência do que queríamos presente e, muitas vezes, temos presenças assombrosas que nos atormentam a mente como vampiros prontos para sugar nosso sangue, beber toda nossa seiva ao menor descuido. Fato que, em diversas ocasiões, somos insanos o suficiente para deixar nossa seiva escorrer, vazar como ar em pneu furado, escoando por entre nossos dedos e sendo sugadas pelos monstros da consciência como água penetrando solo fecundo e seco.
Tão difícil e sofrido viver nessas tentativas de encontros. E, atente para o fato de que não estou referindo-me a encontro com alguém além de nós mesmos. O mais difícil da vida é encontrar-nos em nossa individualidade. O complicado mesmo é sermos generosos e compreensivos quando se trata de entender nossa própria consciência, aceitar as próprias falhas, corrigir os próprios erros e continuar a própria vida. Aparar arestas, escolher caminhos, fechar ciclos e terminar assuntos e sentimentos inacabados pode ser algo complexo, dolorido e altamente frustrante para nossas mentes tão pouco constantes e tão mal acostumadas com a possibilidade da perda.
Não aceitamos a perda. Como iremos então, aceitar que podemos ser nós mesmos os errados e culpados pela sua ocorrência? Como compactuar com a ideia ‘ridícula’ de que podemos ser os únicos causadores de nossas dores e sofrimentos? Mais fácil incutir tal culpa a outrem. Mais fácil e menos desgastante. Acabam as preocupações e medos e, quem sabe, uma boa noite de sono venha para abençoar a escolha.
Infinitamente complexa essa história de ser um animal racional quando, na maior parte do tempo, racionalizar significa aceitar que somos, e muito, passíveis de erros. Talvez até mais do que de acertos.
É sofrer por antecipação. É sumir com a pureza da alma. É abrir fendas no corpo e sentir o sangue escorrer por elas, como se uma faca houvesse ultrapassado nossas entranhas e arrancado pedaços de nossa carne, deixando exposta a complexidade de um corpo dilacerado e de uma alma totalmente perdida e atormentada pela negação do sentido de existir.
Negamos a inteligência que nos foi dada, negamos a qualidade de ‘seres pensantes e racionais’ quando nos acostumamos e aceitamos a mediocridade de sermos sempre os mesmos. De fazermos sempre as mesmas coisas. De termos em nós o tal ‘contentamento descontente’ e nos apoiarmos nisso como se fosse uma tábua da salvação, simplesmente porque temos aquela estúpida ideia de que alguém pode nem isso ter...
Não aceito migalhas porque outro passa fome. Não me contento com esmolas porque outro pode nem isso receber...
Eu quero mais. Eu quero tudo. Eu quero a glória e o inferno. Eu quero o desejo e o desgaste. Eu quero a felicidade e a tristeza. A suavidade e a aspereza. O doce e o amargo. Quero tudo porque vejo aí, a chance de expandir nossa alma para além de nós mesmos. E, quem sabe assim, sobre-nos algum lucro quando fecharmos a ‘conta mensal’ de nossas vidas.